Ao Pedro: Uma espécie de contraditório

É, quase na certa, dos blogs mais bem escritos, bem mais interessantes que povoam o universo gastro-eno-blogueiro. Desta vez, e por causa de mais um excelente post do Pedro, dei comigo, num acto simples de revisão do (meu) passado e reparei que tudo o que ele, o Pedro, refere, nada tinha ou teve a ver comigo. 


Ao vasculhar os emaranhados meandros das minhas origens, dos hábitos e costumes que sempre alicerçaram a minha educação, vejo que muito pouco há de comum com o fado, com o sul - apesar de cá viver há uma vida - e com as suas tradições. Em jeito de brincadeira de criança, e porque circulo por terras de Santiago desde quase sempre, costumo dizer que sou ou serei, sei lá, uma espécie de eterno cruzado.
E recordando a minha genética, produto de uma combinação entre alta-beirã e superior duriense, vejo que ela foi decisória na minha forma de estar, na maneira como olho para o mundo. 


Reparo que até muito tarde, o Sul era qualquer coisa de estranho, de anacrónico. Faltavam sistematicamente as montanhas, o frio, as pedras, ou melhor: os penedos e as fragas. Os rios, cá em baixo, eram diferentes, menos tensos, menos aguerridos. Os cheiros eram diferentes, desorientavam. A comida parecia ligeira demais, sem corpo, sem peso, com uma delicadeza estranha. O vinho, até o vinho, era diferente.
Lá para cima, Pedro, não havia cante e devo dizer-te que quando ouvia aquilo, parecia estar a escutar qualquer coisa que vinha lá de uma terra que não era a minha, que não fazia sentido. O (meu) folclore era outro, mais ruidoso, mais mexido, mais aguerrido. Não era melhor, nem pior. Era simplesmente diferente.


Posso partilhar contigo, Pedro, que em tempos, na universidade, metia-me sistematicamente com uma alentejana, contando infindáveis histórias cómicas sobre os seus hábitos e sobre o seu povo. Ela na sua típica postura sulista, retorquia sempre da mesma forma e no mesmo timbre: Hás-de casar com uma alentejana e acabar por viver no Alentejo. Eu, de olhar duvidoso sobre tamanha certeza, acenava com um convicto não. E não é que a vida acabou por dar-lhe razão. 

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