Quinta do Carvalhão Torto (Dão)

Quando caminhava pela estrada, mirava de relance um cartaz de dimensões generosas. Ao passar pelo sítio, reparava que no outro lado da rua, estava a pequena adega da Quinta do Carvalhão Torto (Nelas). Aspecto limpo, simples e acolhedor. Nunca consegui parar lá. Os destinos traçados levavam-me a seguir caminho. Na ida, chegar à casota. Na volta, regressar ao buliço da grande Lisboa. Adiei sistematicamente a prova daqueles vinhos.
Numa ida a um pequeno super lá da terra, mesmo em frente à casa, ao olhar para a secção das bebidas, encontrei três vinhos da tal Quinta. Os preços navegavam entre os 5€ e qualquer coisa e os 4€ e qualquer coisa. Um Reserva e dois bi-varietais. Peguei num saco e levei-os dali. Provei-os na sala dos fundos. Iria estudar o que estava dentro de cada garrafa.

A primeira a ser vasculhada continha um tinto (de 2005) formado por Touriga Nacional&Jaen. 12,5% de graduação alcoólica. Valha-nos isso.
Relativamente fechado no início. Alguma dificuldade para entender o que tinha em frente. Não sabia se estava perante um tinto sisudo ou, eventualmente, com poucos atributos. A prova foi lentamente alegrando com cheiros tendencialmente silvestres, de intensidade ligeira, com uma discrição algo exagerada. Sei que estamos domesticados por vinhos super exuberantes. Acredito que esse facto possa toldar, ou tolher, as nossas capacidades de percepção.
Apesar, da ligeireza, destrincei umas quantas amoras e groselhas. A caruma surgia por todo o lado. Marcou fortemente o vinho. Deu-lhe um certo toque regional. Durante minutos, estes foram os aromas que apanhei.
Alegrou mais um pouco
, na parte final, com flores (tinha lido o rótulo).
Na boca os sabores pareceram-me parcos. Mantinha a matriz silvestre. Acidez pedia urgentemente por comida com (alguma) gordura. Ganhou, um pouco mais, com umas rodelas de chouriça. Insuficiente. Nada que o levasse para muito longe. No final ficava, apenas, a acidez.
Um tinto do Dão que trouxe poucas novidades. Precisa de mais alma. Primeira etapa concluída. Nota Pessoal: 13

No segundo varietal, a Jaen surge, agora, misturada com Alfrocheiro. A graduação alcoólica passa para os 13% e o ano de baptismo é 2004.
Fiquei com a leve ideia que era diferente. Mais redondo, mais quente. Seria o alfrocheiro a influenciar o comportamento?
Mostrou um estilo mais consensual, menos regional. Sentia-se o sumo a escorrer pela goela. Algumas gomas davam-lhe um ar urbano. Alguma passa e um toque de caramelo (não consegui encontrar outra comparação) intensificavam o lifting.
Apesar da mudança de atitude, conseguiu manter-se fresco e vivo, acabando por revelar o local de onde veio. O silvestre marcava, mais uma vez, presença (tanto nos cheiros, como nos sabores).
Na boca senti um conjunto de sabores que puseram-me a pensar na menta, na hortelã. Em certos momentos, fizeram-me recordar o chocolate after-eight. Impressão (ou imaginação) minha.
Um tinto com maior intensidade (sem perder delicadeza), que conseguiu dar o salto para o outro lado. Gostei. Nota Pessoal: 14

Post Scriptum: O Reserva ficará para outra altura, se houver tempo. Agora vou continuar a tirar as roupas da mala.

Comentários

Felisberto Ramos disse…
O Carnaval em Canas foi mais gostoso com os vossos vinhos.
Um grupo de tripeiros