Também há lugar para beber com a Família

Beber com a família também faz parte da nossa vida. Se calhar, é com a família que se bebe mais e demais. Nem sempre com qualidade. Assumo que em muitas ocasiões se fazem alguns excessos, que no futuro irei pagar uma factura elevada. Mas até lá...
Desta vez, juntei alguns famíliares à mesa, aproveitei para voltar a tomar o pulso a um vinho que já tinha provado e gostado no passado. Nem sempre aquilo que nós gostámos no passado, volta a saber bem. Nós mudamos. E a vida, como sabem, é cheia de variáveis que não conseguimos controlar, que podem influênciar determinadas atitudes. Fundamental é manter a boa disposição viva. Sentimento que ultimamente não tenho conseguido ter. Sinto que a minha úlcera a dar o sinal. Ela manifesta-se quando ando irritado, chateado, sem qualquer sentido de humor. Estes últimos dias têm sido fertéis em más notícias. Bom, esqueçamos este pequeno desvio de filosofia barata e voltemos ao que conta.
Os comentários mais uma vez são meus, feitos à medida que ia bebendo e conversando.
Tive que aguentar durante toda a refeição o tom de gozo, as piadas daqueles que estavam comigo à mesa. Tentei ao máximo distanciar-me de toda a risota que se instalou à minha volta. E olhem que algumas das piadas faziam mesmo rir. Se calhar até tinham razão. Onde é que encontro estes todos aromas e sabores? Grande parte da resposta, se calhar, está na brutal imaginação que anda a vaguear pela minha cabecinha em certos dias. Vocês lá me dirão se ando a exagerar ou não. Como sempre digam, se quiserem, de vossa justiça.
FSF Garrafeira 2001. Um vinho feito de um lote com syrah, tannat e trincadeira. Com 14% de graduação alcoólica. Das Terras do Sado, bem ao lado onde moro.
Aromas de fruta. Quente, mas sem grandes exageros na maturação. Apontamentos florais e silvestres com alguma intensidade, juntos com tiques balsâmicos e impressões vegetais que tive alguma dificuldade em descrever ou, se calhar, começa a não ser fácil encontrar adjectivos. Depois evolução para musgo, fetos. Alguma especiaria, café, mineral e couros. Com alguma densidade. Gostei muito dos aromas, muito mesmo.
A boca com fruta, com frescura e estruturada. Taninos envolvidos pelo corpo. Acidez proporcionando frescura, nunca caindo no abismo. Um vinho com pujança, mas pareceu-me comportado, cavalheiresco e com alguma distinção, tal como o senhor que está retratado no rótulo.
Final entre o médio e o longo, deixando um rasto picante agradável. O tempo fez-lhe bem, ficou mais equilibrado. Um vinho que não ficou preso do castelão e introduziu uma casta "exótica" como é a tannat. Pessoalmente não faço a minima ideia como se comporta. Uma desconhecida para mim. Custa qualquer coisa como 20€. Tenho-o visto regularmente nas prateleiras de alguns hipermercados. Em resumo, um vinho que me agradou, o que é importante e deu para fugir um pouco às tradicionais regiões. Nota Pessoal: 16,5

Moscatel JP 2000. Bacalhôa Vinhos. Moscatel de Setúbal. Cor amarelo-torrado, com laivos alaranjados. Nariz fresco, bem feito e agradável. Casta de laranja caramelizada, amêndoas e nozes. Algum limão. Boca correcta, fresca e docinha, que deixa um rasto muito saboroso na boca. Servir fresquinho. Deu para iniciar e terminar o repasto. Um moscatel muito correcto, barato e que agora vem datado. Por 4€, melhor será impossível. As coisas simples também têm lugar na nossa vida. E ser simples não é de certeza sinónimo de inferioridade. Nota Pessoal: 15

A ementa foi feita por mim. Nada de especial. Um crepe recheado com cogumelos e aves, com molho bechamel. Uma agulha de vaca estufada que acompanhou com um arroz selvagem, aromatizado com hortelã e oregãos. Para a sobremesa, umas fogaças de Alcochete. Ninguém foi parar ao hospital por minha causa.

Comentários

Eduardo Lima disse…
Caro Confrade, aqui por estas terras de além mar têm boa fama os vinhos da Bacalhoa, com destaque especial para o Quinta. A mim também agrada bastante o Meia Pipa. Agora, aproveitando o gancho da crônica do amigo,fiz recentemente um jantar em casa para a família em que um honesto Serras do Azeitão satisfez de modo pleno as axigências dos numerosos comensais e do meu combalido bolso. Bem sabes que a moeda aqui não é tão forte e, apesar do tamanho continental, não há neste Brasil nem alentejo nem uma península de Setúbal para nos prover de bons vinhos. Grato pelo elogio do texto.